Porque é que as nossas crianças comem em pratos de cerâmica e não de plástico?

26 de maio de 2023

Muitos dos pais que visitam as nossas unidades ficam surpreendidos ao ver crianças em idade pré-escolar manusearem talheres de inox, bem como pratos e copos feitos de materiais que podem se partir caso não sejam tratados com cuidado. No entanto, esta escolha deliberada de usar pratos e copos de materiais delicados tem uma base educativa forte e que é fundamental para perceber a essência da nossa pedagogia.

Neste artigo, vamos explorar o motivo desta abordagem, destacar os seus benefícios para o desenvolvimento das crianças e responder a algumas das dúvidas mais frequentes relacionadas com este assunto.

Atividades práticas do cotidiano

Nas nossas unidades Open Learning, reconhecemos a importância das atividades práticas do cotidiano, um conceito introduzido pela educadora visionária Maria Montessori com o intuito de descrever uma variedade de tarefas importantes no dia a dia de crianças e adultos. Com atividades que vão desde o simples lavar das mãos antes e depois das refeições até arrumar um espaço, regar plantas sem molhar o chão, lavar a louça, pôr a mesa ou mesmo cozinhar, as crianças têm a oportunidade de adquirir competências essenciais para a vida. Ao participar ativamente nestas tarefas, ganham independência, desenvolvem concentração e fortalecem a sua autoconfiança.

Qual a importância destas atividades para as crianças?

Independência: Através de atividades como pôr a mesa, servir comida e limpar, as crianças aprendem a assumir responsabilidades pelo ambiente que as rodeia.

Capacidades motoras: Muitas destas atividades requerem movimentos precisos, coordenação mão-olho e capacidades motoras finas. Verter água, cortar alimentos ou utilizar utensílios de inox para comer envolvem um toque delicado e um controlo refinado das mãos.

Aprendizagem Significativa: A atribuição de significado e relevância aos conteúdos aprendidos, relacionado-os com experiências prévias, cria uma ligação mais profunda com o conhecimento, tornando a aprendizagem mais relevante para as crianças.

Concentração: Embora estas atividades possam parecer simples para nós adultos, elas requerem que as crianças estejam inteiramente focadas na tarefa em questão. Esta capacidade de concentração será uma mais-valia quando for necessário lidar com tarefas mais complexas.

Organização: Um ambiente ordenado contribui para uma mente organizada. Ao realizar estas tarefas, compreendem que cada atividade tem uma sequência específica e que manter um ambiente arrumado e estruturado permite uma conclusão mais fácil e eficiente das tarefas.

Competências sociais: As atividades da vida prática implicam, frequentemente, a interação com os outros. As crianças aprendem a trabalhar de forma harmoniosa e respeitosa em comunidade.

Porquê pratos de cerâmica?

Correção do Erro

Uma das principais razões pelas quais os nossos jovens comem em pratos de cerâmica, em vez de em pratos de plástico, é para lhes dar a oportunidade de aprender com os seus erros e desenvolver um sentido de responsabilidade. Esta correção não tem a ver com apontar e corrigir erros, mas sim com encorajar as crianças a reconhecê-los de forma autónoma e a tomar as medidas necessárias para os retificar.

Ao contrário do que acontece com os pratos de plástico, que podem resistir a um manuseamento descuidado, os pratos de cerâmica são delicados suscetíveis a partir-se. Quando a criança deixa cair um prato, depara-se imediatamente com o resultado da sua ação. Esta relação de causa-efeito contribui para uma maior consciencialização, responsabilidade e respeito pelo ambiente que a rodeia.

Outro elemento que cumpre esta função são as caixas com diferentes formas geométricas recortadas na parte superior. Para a criança conseguir colocar um cubo dentro da caixa, terá de encontrar a ranhura quadrada, caso contrário, a peça não irá encaixar. Ou seja, através do manuseamento daquele material, a criança é capaz de se autocorrigir e perceber se está a realizar a ação de forma adequada ou não.

Este tipo de recursos, que permitem a criança aprender por si própria, sem nenhuma ajuda externa ou correção de um adulto, são um dos pilares da nossa pedagogia, dado o seu papel fundamental para a criação de uma aprendizagem significativa e independente.

Adicionalmente, caso uma criança deixe cair um prato, podemos utilizar essa situação para criar mais um momento de aprendizagem relevante ao demonstrarmos o que fazer quando algo do género acontece. Encorajamos as crianças a participar no processo de limpeza, explicamos como apanhar as peças partidas de forma cuidadosa e como deitá-las fora em segurança. Este tipo de atividade não só cultiva um sentido de responsabilidade pessoal, como também desenvolve a sua capacidade de resolver problemas, uma vez que a criança aprende a analisar a situação, a pensar de forma crítica e a contribuir ativamente para a resolução do problema.

Comer em pratos de cerâmica incute um sentido de cuidado e respeito pelos objetos que usamos diariamente. As crianças compreendem rapidamente que alguns materiais requerem um manuseamento cuidadoso, atenção e um nível de sensibilidade elevado. Esta mentalidade estende-se para além do domínio dos pratos, refletindo-se nas abordagens adotadas pelos jovens noutros aspetos das suas vidas.

Educação sensorial

Além da correção do erro, outro motivo que nos leva a optar por pratos de cerâmica está relacionado com a importância da educação sensorial no desenvolvimento das crianças. Numa etapa infantil, os jovens aprendem através das relações interpessoais e das experiências sensoriais.

Quem já nos visitou sabe que valorizamos a aprendizagem multissensorial das crianças. Temos espaços rodeados de natureza e animais onde as crianças podem tocar e explorar diferentes texturas, cheiros e sons. Este alargamento do vocabulário sensorial permite que elas façam conexões mais profundas com o mundo que as rodeia e desenvolvam capacidades cognitivas essenciais como preparação para a educação intelectual que virá mais tarde.

Através da utilização de pratos de cerâmica, copos de vidro e talheres de inox, as crianças têm a oportunidade de expandir ainda mais a sua experiência sensorial durante as refeições. Cada material possui características únicas que proporcionam estímulos táteis, visuais e até mesmo sonoros. O uso destes materiais texturalmente diversos permite que as crianças desenvolvam a sua sensibilidade, organizem as sensações e afinem a sua perceção.

Mas não é perigoso?

Esta é uma pergunta comum e completamente justificada dos pais nas suas primeiras visitas às Open Learning Schools. Usar materiais indestrutíveis pode parecer uma solução mais segura, pois estaremos a eliminar a possibilidade que algum deles se partir e criar uma situação de perigo.

No entanto, é importante destacar que a introdução destes materiais na rotina das crianças é feita de forma gradual e cuidadosa. Não começamos de imediato com um conjunto de mesa delicado durante os lanches ou almoços. Iniciamos o processo introduzindo os pratos de cerâmica primeiro, dando o tempo necessário às crianças para se familiarizarem com o peso e a sensação destes objetos.

Além disso, os nossos tutores estão sempre presentes nestes momentos para guiar e supervisionar todo o processo, estando sempre atentos às necessidades individuais de cada criança, de forma a  oferecer o apoio e orientação adequados, especialmente a crianças que não estão habituadas a comer com estes materiais.

Por último, é importante mencionar que tanto os pratos como os copos são feitos de materiais resistentes que aguentam impactos ligeiros e que foram construídos para que, caso se partam, não se estilhacem em pequenos fragmentos, mas sim em pedaços maiores e menos afiados.

Quando devo começar a utilizar este tipo de materiais na rotina dos meus filhos?

Cada criança é única, portanto, é essencial respeitar o ritmo e as necessidades individuais de cada uma. Algumas crianças podem estar prontas para utilizar materiais delicados mais cedo, enquanto outras poderão desenvolver a destreza necessária apenas mais tarde.

Normalmente, por volta dos dois ou três anos de idade, a coordenação motora das crianças já está suficientemente desenvolvida para começar a experimentar comer com materiais mais frágeis.

Quando considerar que o seu filho está preparado, comece a apresentar os objetos de forma gradual durante as refeições e sempre com a sua supervisão. Aos poucos, irão ganhar mais confiança, responsabilidade e sensibilidade com os objetos mais delicados.

Posts Relacionados